SAUDE PÚBLICA X SAÚDE
PRIVADA!
Somos de um tempo em que um médico de referência em seu consultório, era também
médico de um hospital público, sempre de qualidade. Naquele tempo não tínhamos
o SUS. O atendimento médico limitava-se àqueles empregados que
contribuíam para os seus institutos e recebiam dos mesmos, através de hospitais
próprios, a sua assistência à saúde. Os outros, que não descontavam
para os “institutos”, eram atendidos pela rede pública que, igualmente,
era eficiente e resolutiva. Isto, é claro, no Rio de Janeiro, a antiga capital
da República, que concentrava os melhores médicos e melhores hospitais. Naquele
tempo, a UFRJ, a UERJ e a Faculdade de Medicina e Cirurgia, acompanhadas
bem de perto pela Escola Médica do Rio de Janeiro da
Universidade Gama Filho, eram o sonho e o desembocadouro de tantos jovens
idealistas que escreveram a história da medicina em nosso país.
Era o tempo do Hospital dos Servidores do Estado, hospital da
corte, do Hospital do Andaraí, Hospital Ipanema, Hospital da Lagoa, Iaserj,
Bonsucesso, Gamboa, sem falar do Miguel Couto, Souza Aguiar, Salgado Filho e do
mesmo “longínquo” Getúlio Vargas. Eram todos, acreditem, TODOS, hospitais de
referência. E o seu corpo técnico: médicos, enfermeiras, atendentes, serventes,
ascensoristas, diretores ( na época ainda não se chamavam gestores...)
profissionais competentes, responsáveis e orgulhosos de suas funções.
Em um bom momento foi criado o SUS!
Uma
tentativa, ou um sonho, de reproduzirmos para todos os brasileiros, de Norte ao
Sul deste país, uma assistência médica que até então só se conduzia na capital
federal e se repetia em menor escala em outras capitais como São Paulo, por
exemplo. Um sonho de dividirmos o melhor, e não este pesadelo de dividirmos
para piorar.
A constituição cidadã de 1988, daria forma e contexto a este sonho! E como em
um passe de mágica, todo brasileiro teria direito pleno a uma saúde
equânime e universal, garantida como direito do cidadão e
obrigação do estado.
Vivemos este sonho! E foi um momento mágico! Para nós e toda aquela
geração de médicos e profissionais de saúde que buscaram, no saber
e na excelência, uma forma de aliviar o sofrimento de um povo já,
historicamente, tão explorado e sofrido!
Os tempos passaram...
Hoje, abrindo os jornais, deparamo-nos com a informação que o ministro da Saúde
do meu país discursou a favor da “importação de médicos cubanos e de
outros países para resolver o problema da assistência desproporcional da
saúde”. E o senhor ministro da Educação (?) defende a
abertura de novas faculdades (?) de medicina. Interessante o Brasil ...
Dentre todos os países do mundo, só perde em número de faculdades de
medicina para a Índia, que tem quase seis vezes numericamente
a nossa população. Será que estas autoridades falam sério ? Será que foram
orientadas por quem realmente quer ver uma saúde pública melhor para todos ?
Será que foram ouvidos pacientes, médicos, profissionais de saúde, enfim
aqueles que realmente entendem e frequentam os corredores do SUS ?
A quem interessa esta “importação”? A quem interessa esta nova ”abertura”
de faculdades? Ao povo brasileiro? Aos pacientes do SUS? Aos usuários da saúde
suplementar? Claro que não ! Ela interessa, isto sim, a um “status”
que não conseguindo cumprir suas obrigações constitucionais, lança mão de
artifícios e factoides, referenciando médicos de qualidade inferior, para
atender pacientes que, discriminadamente (apesar do discurso contrário),
consideram como “inferiores”. Confundem deliberadamente a opinião
pública e demonizam os profissionais da saúde como os
responsáveis pelo vergonhoso desempenho da saúde pública e também
privada em nosso país. Ela interessa, principalmente, àqueles que,
à luz de motivos inconfessáveis, enriquecem com o sucateamento do SUS e
da qualidade do ensino médico em nosso país.
A medicina que nos interessa, a todos nós como usuários, é aquela
exercida por profissionais competentes, qualificados, valorizados em seu
exercício profissional, mediada por um estado comprometido com a nossa
saúde, e não outra, arquitetada pelos meandros políticos das
conveniências partidárias.
Não
nos iludamos! A diferença entre saúde pública e privada não interessa a nenhum
de nós. Sejamos pacientes que necessitam de assistência ou profissionais de
saúde conscientes e honestos. Interessa, isto sim, a uma administração
irresponsável e aos que “vendem” saúde e lucram com a sua ausência!
Não
temos conhecimento de nenhum médico que foi treinado em duas “medicinas”;
a pública e a privada! Conheço sim, médicos e profissionais, entre os quais nos
incluímos, que são formados para exercer a medicina de uma forma
plena, integral e igualitária. E foram forjados em hospitais públicos. Como no
sonho do SUS!
Temos condições de ainda sonhar! Para isto, temos que repelir estas atitudes
politiqueiras e corporativas que, infelizmente, impedem o
nosso caminho para uma medicina pública eficiente, ética e democrática.
Como no sonho do SUS!
Chega de gestores! Precisamos de médicos e profissionais de saúde competentes.
E isto não nos falta! O que nos falta é caráter e espírito
público! Este é o sonho do SUS ! O nosso sonho!
Dr. Emílio César Zilli
Diretor de Defesa Profissional da Associação
Médica Brasileira
Dr. Florentino Cardoso
Presidente da Associação Médica Brasileira
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